De certo que é assim que sim, pois sendo da nossa índole compararmo-nos a todas as coisas e comparar todas as coisas conosco, a nossa felicidade ou desgraça dependem dos objetos desse confronto; de sorte que nada é mais perigoso para nós do que a solidão. Nossa imaginação, inclinada por natureza a exalar-se, e, ainda, excitada pela poesia, dá corpo a uma escala de seres onde ocupamos sempre um lugar o mais insignificante. Tudo o que está fora de nós parece mais belo, e todos os homens mais perfeitos do que nós. E isso é natural por que sentimos demasiado as nossas imperfeições, e os outros parecem possuir precisamente aquilo que nos falta. Desse modo, nós lhes concedemos tudo quanto está em nós mesmos e, para coroar a obra, lhes atribuímos também certas qualidades ideais. E assim criamos nós mesmos um conjunto de perfeições que por sua vez cria o nosso tormento. Por outro lado, quando perseveramos em nossos próprios esforços, apesar da nossa fraqueza e dificuldades, avançamos muito mais que os outros, que remam e usam vela: é quando nos igualamos ou suplantamos os demais, que sentimos o nosso verdadeiro valor.
Werther, 20 de outubro de 1771
(Os sofrimentos do Jovem Werther; Goeth)