“[...] Ele continuou, alongando o seu tema. Afinal, por não o escutar mais, pus-me a devanear. De repente, com um gesto brusco que atraiu sua atenção, apontei o cano da pistola à fronte, abaixo do olho direito.
- Pare! Mas o que é isso?! - exclamou Albert, abaixando a pistola.
- Não está carregada - respondi-lhe.
- E, mesmo assim, que é que significa isso? - replicou ele impaciente - Não consigo imaginar como um homem possa ser tão insensato para se dar um tiro. Só em pensar nisso sinto repulsa.
- Por que, vocês, homens - gritei - não podem falar de uma coisa sem logo declarar: ‘Isso é insensato, aquilo é razoável, aquele outro é bom, isso aí é mau’? De que servem todas essas palavras? Vocês já conseguiram, graças a elas, penetrar as circunstâncias ocultas de uma ação? Sabem com rigorosa certeza as causas que a produzem, que a tornam inevitável? Se assim fosse, não enunciariam com tanta rapidez os seus julgamentos. Oh! Essas pessoas sensatas! Paixão! Embriaguez! Loucura! E se conservam tão calmos, tão indiferentes, vocês, os homens da moral esmurram o bêbado, repelem o louco, e passam adiante, como o padre, como o fariseu que agradece a Deus por não ter feito igual aos outros! Embriaguei-me por mais de uma vez, e as minhas paixões estiveram sempre à beira da loucura, e disso não me arrependo, porque só assim cheguei a compreender, em certa medida, a razão por que, em todos os tempos, sempre foram tratados como bêbados e como loucos os homens extraordinários que realizaram grandes coisas – as que pareciam impossíveis... Mas, ainda na vida comum, nada mais insuportável do que a todo momento ouvir gritar, sempre que um homem pratica uma ação intrépida, nobre a grandiosa: ‘Esse homem está bêbado! É um louco!’ Que vergonha vocês que vivem sóbrios! Que vergonha, homens sensatos! [...]
- A Natureza humana - prossegui- é limitada: ela suporta a alegria, a tristeza, a dor, até certo ponto; se o ultrapassar, irá sucumbir. A questão não é saber, pois, se um homem é forte ou fraco, mas se é capaz de suportar a medida de sofrimento, moral ou físico, que lhe é imposta. Nesse caso, acho tão absurdo dizer que um homem é covarde por haver dado cabo da própria vida, como seria absurdo chamar de covarde o que está morrendo de uma febre malígna."
- A Natureza humana - prossegui- é limitada: ela suporta a alegria, a tristeza, a dor, até certo ponto; se o ultrapassar, irá sucumbir. A questão não é saber, pois, se um homem é forte ou fraco, mas se é capaz de suportar a medida de sofrimento, moral ou físico, que lhe é imposta. Nesse caso, acho tão absurdo dizer que um homem é covarde por haver dado cabo da própria vida, como seria absurdo chamar de covarde o que está morrendo de uma febre malígna."
Werther, 12 de agosto
(Os sofrimentos do jovem Werther; Goeth)
Nenhum comentário:
Postar um comentário